Tudo começa com “Homem não gosta de mulher X” ou “Homem quer uma mulher Y”.
“Cortaste o cabelo! O que o teu parceiro acha disso?”
“Conseguiste bolsa para estudar fora. Vais deixar o teu parceiro? Vais obrigá-lo a mudar de país, deixar a carreira para te acompanhar?”
“Não podes aceitar esse emprego, senão não terás tempo para cuidar dos teus filhos.”
Às mulheres é esperado um comportamento submisso. Elas são desde cedo treinadas para tal, raramente encorajada a seguir as tuas vontades, assumir os seus ideais com convicção e autonomia.
Mesmo as mulheres economicamente estáveis, escolarizadas e com carreiras de sucesso é cobrada a “família”. Sempre nos perguntamos se ela consegue conjugar tudo isso, caso contrário, ela está a falhar. Como mulher ela sozinha não basta.
Mulheres são socializadas para aspirarem uma relação heternormativa em que é uma personagem secundária na sua própria história. É encorajada a abdicar dos seus sonhos e metas pessoais pela “família” (leia-se marido e filhos). É pressionada a ceder a todas e quaisquer vontades do seu parceiro, independentemente de concordar, muito menos compreender.
Quando as mulheres tentam sair dessas situações são pressionadas, muitas vezes por familiares e amigos, a tolerarem e aguentarem. As mulheres que saem são tidas como “fracas”, “mulheres de pouca fibra”, pois casamento é assim mesmo, é para ser infeliz e sofrer todos os dias.
E nesse papel de subalternidade, torna-se sujeito de outrem. Propriedade alheia. O que ela quer e o que ela sonha não mais importa. A mulher não tem poder de decisão, não tem opinião, praticamente não existe. Ela nada é senão um corpo, um pedaço de carne ali especado para entretenimento do seu esposo.
É nesse espaço vulnerável que é espancada, agredida, violada e até mesmo assassinada.
Todos os dias uma mulher morre nas mãos do seu parceiro.
Todos os dias.
Todos os dias somos violadas, espancadas, esquartejadas, assassinadas. Não é só onde eu vivo, é em todo o lado.
A violência contra a mulher tornou-se num espectáculo. Ligamos um telejornal qualquer e lá está mais um nome, mais uma mulher morta nas mãos de quem confiou, mais um número, uma cara anónima no meio de tantas outras.
Depois da notícia, uma outra coisa virá, mais ou menos sensacionalista e logo logo nos esquecemos do sucedido com aquela mulher. A vida segue.
Como sociedade nada fazemos para abordar o assunto de forma efectiva e eficaz, não trazemos soluções específicas para este tipo de violência, não procuramos respostas para fazer frente ao sofrimento de tantas mulheres.
Recentemente em Angola um novo grito, #ParemDeNosMatar fez ecoar o suplico de tantas vítimas. Foi o brutal assassinato da advogada Carolina , de 26 anos que forçou uma tão urgente conversa sobre a violência doméstica.
Entre marido e mulher mete-se a colher sim! O problema da violência doméstica é estrutural e ultrapassa o casal. É um problema que está nas nossas casas, nos gritos que vêm das casas dos vizinhos, nas marcas do corpo das nossas colegas e amigas, no silêncio assustado daquela tia que nem sequer encara o marido nos olhos, na conivência de toda a sociedade que aumenta o volume do som para abafar o grito de socorro que vem da rua.
Todos os dias uma mulher morre nas mãos do seu parceiro.
Todos os dias.
Texto que exprime a nossa verdade. Chega dessa educação de opressão, de ensinar que violência é normal e que não ter sonhos próprios é honroso para a mulher. Não é. Pior é que essa educação vem de outras mulheres, essas que deviam ensinar às filhas a ter valor e não aceitar do homem nenhuma opressão, nenhum abuso, que deviam ensinar a menina a ter sonhos grandes e correr atrás deles, que deviam apoiar e abraçar uma as dores das outras e lutar por justiça e não apelar ao “casamento é sofrimento”.
Infelizmente todos nós – homens e mulheres – somos criados e socializados dentro desse sistema patriarcal, de tal forma que mesmo as mulheres oprimidas defendem a sua opressão. Alegam elementos culturais, naturais, tradicionais, etc para acreditarem que o sofrimento por que passam é “normal” e assim acabam por perpetuar o ciclo. Mas felizmente as nossas vozes estão aqui para dizer “BASTA!”.
Sad reality. But it is our reality.
Um dia irei ler um livro teu e mensagens como esta chegarão aos ouvidos de mulheres como tu e eu mas sobretudo, aos ouvidos do homem que na sua mulher bateu.
Muito obrigada pela força 🙂