O filme Sarafina! de Darrell Roodt retrata uma geração de Freedom Fighters na África do Sul durante o apartheid.
De madrugada, um grupo de sombras atravessa sorrateiramente o percurso para a escola do bairro. Passando pela linha férrea, saltando muros, a escuridão como cúmplice, galopando até que chegam ao destino: uma escola.
Atiram uma “bomba” caseira, que incendeia uma sala de aulas inteira.
À partida, parece que estamos perante um grupo de jovens vândalos sem nenhuma causa senão o prazer de estragar propriedade pública.
Mas à medida que a história se revela, percebemos que na verdade os jovens vândalos estão a protestar contra um sistema de ensino que em nada os favorece. Estão a protestar contra o racismo institucional que lhes oprime diariamente. Estão a protestar contra a falta de condições para crescerem e se desenvolverem.

Sarafina, a nossa protagonista é uma jovem estudante que se vê no meio destes conflitos.
Como uma menina negra que vive sobre o regime do apartheid, encontra no exemplo de Nelson Mandela a sua inspiração. É nele que desabafa as suas angústias e anseios.
Mandela é uma presença constante, a liderança forte e fidedigna de que ela precisa para manter-se sã e seguir os sonhos.
Em forma de musical, o filme mostra por um lado a esperança e alegria de Sarafina, que sonha em ser famosa, e por outro, a violência e perversidade do regime do apartheid.
Mesmo sem ser explícito no que toca às leis e repressão em que viviam os negros sul-africanos, sente-se ao longo do filme como a opressão ecoava em todas as esferas das suas vidas.
Desde o quarto em que dorme, Sarafina e os seus irmãos, apertados na única cama e no chão até ao medo constante de uma palavra, um olhar ou mesmo um sonho fora do lugar.
Desde as ruas não alcatroadas; o fraco saneamento até ao sistema de ensino que limitava as opções dos jovens estudantes negros.
A covardice da classe opressora, representada pela patroa da mãe de Sarafina, que vive indiferente aos desafios enfrentados pela sua empregada doméstica, que sozinha e à distância, sustenta a sua família.

Embora o filme não mostre quem eram os brancos no poder, o filme evidencia como todos os brancos sul africanos eram apáticos, não questionando nem desafiando o status quo, pelo contrário até o fortaleciam.
Os negros viram-se contra eles mesmos, roubando, matando, extorquindo.
As alianças quebram-se e as fraquezas de cada lado revelam-se. Não há vilões e nem heróis.
Sarafina e os seus amigos vêem-se perdidos, sem um rumo próspero. Despidos da sua humanidade, vêem-se também eles próprios, a despirem os outros do seu lado humano.
Perante isto, as linhas que separam a paz da guerra; o certo do errado e o impensável do possível tornam-se turvas.
O filme é um importante testemunho, feito por sul-africanos, daquilo que se viveu e aconteceu durante os finais anos sangrentos do apartheid, oferecendo um olhar real e intemporal da África do Sul, a nação arco-íris.